domingo, 23 de setembro de 2007

5° Capítulo - Parte II

Plínio serviu o almoço, que poderia ser considerado como jantar, visto que já eram dezessete horas. Comemos e bebi, rapidamente, as duas garrafas de cerveja. O ambiente era novo e excitante, mas não tinha afinidades com Jonas e seu amigo. Conversaram o tempo inteiro sobre aulas de matemática. Plínio também era formado em Matemática. Fiquei o tempo todo calado, observando a pintura das paredes da cozinha. Eram decoradas com desenhos de nuvens cinzas e anjos amarelos em um fundo azul e branco.

- Quem teve a idéia dessa pintura? - Perguntei.

- Fui eu queridinho. Gostou? - Plínio respondeu.

- É diferente.

- Essa pintura era da época em que isso aqui era uma boate gay.
- Jonas esclareceu.

- Aqui foi uma boate?!

- Das mais badaladas.

- Por que acabou?

- Tava tendo problemas com a vizinhança.
- Imaginei como deveria ser uma boate gay. Cheia de homens maravilhosos em busca de sua outra metade. Talvez fosse o lugar que eu precisava...

Nesse momento entra um rapaz magro, com um olhos grandes e cabelos negros, lisos e cheios. Deveria ter a minha idade. Achei-o interessante.

- Oi pessoal! A praia tava ótima. Dei um pulinho lá nas pedras do Flamengo! Tava uó! A pegação tava fervendo. - Por um momento não entendi nada do que ele falou. Durante os esclarecimentos que eram dados pelo rapaz pude entender que "uó!" significava bom, animado; que "pegação" era transa entre homens e que as pedras do Flamengo eram um ponto de encontro.

- Aírton esse é Jeremias, meu caso. - Jonas me apresentou e estranhei aquele termo, mas depois vim a saber que no meio gay, a pessoa com quem você está, não é seu namorado e sim, seu caso.

- Tudo bem, Jeremias? - Aírton apertou minha mão. Seu olhar tinha um brilho diferente. Ele transmitia energia, vida. Totalmente diferente de Jonas que mais parecia uma múmia.

- Plínio tinha me dito que você mora aqui. - Falei olhando em seus olhos.

- É verdade. Por enquanto, até eu conseguir um lugar só meu.

- Vamos até lá fora, Jeremias?
- Jonas perguntou e eu percebi que as relações entre os dois não eram das melhores.

Fomos para o quintal, mas a minha mente ficou com Aírton. Acho que Jonas percebeu, pois logo deu uma desculpa para Plínio e fomos embora, antes que Aírton saísse do banho.

Durante o caminho de volta, quase não conversei com Jonas. Aleguei que estava com dor de cabeça. Não sei se acreditou, mas não insistiu.

Durante toda a semana, Jonas, a casa de Plínio, a história da boate gay e principalmente Aírton não saíram do meu pensamento. A idéia de suicídio desapareceu. Foi mais fácil enfrentar os dias de trabalho na Sonda. Havia encontrado um sentido e ele se chamava Aírton.

No sábado tomei algumas doses de cachaça com suco de laranja e telefonei para a casa de Jonas. Meu único desejo era reencontrar Aírton.

- Jonas? É Jeremias!

- Oi! Tudo bem! To com saudade.

- Eu também. A gente vai se encontrar hoje?

- Claro! Onde?

- Vamos voltar na casa do seu amigo?

- Que tal você dá uma passadinha aqui na minha casa?

- É... pode ser...
- Não era bem isso que eu queria.

- Anota o endereço. - Anotei muito contrariado.

Fui até a casa de Jonas. Era pequena e escura. Os móveis eram sóbrios, muito parecidos com seu dono.

Assim que entrei Jonas me beijou. Foi entediante como o primeiro, na casa de Plínio. Mostrou-me toda a sua casa que era formada por cozinha, banheiro, quarto e sala.

Ao entrarmos no seu quarto, tirou sua camisa e mandou que eu ficasse à vontade. Sentei-me em sua cama e tirei a camisa. Não tinha muita vontade de transar com ele, mas sob os efeitos do álcool, ficou fácil deixar que acontecesse. Ele tomou a iniciativa e nós transamos... Fingi o quanto pude, mas não foi bom... Também não foi ruim... Foi...

- Acho que to me apaixonando por você. - Disse Jonas.

- Eu também gosto de você. - Era o máximo que conseguia falar.

- Você não tem o ranço das bichinhas que freqüentam a casa de Plínio.

- Não sei se é um elogio, mas, obrigado.

- O que você achou de Aírton?
- Assustei-me com a pergunta inesperada.

- Como assim?... Não entendi o que você quer saber.

- Qual foi a sua impressão?

- Sei lá!... Parece ser um cara alto astral.
- Não sabia o que dizer. Precisava disfarçar.

- Eu tive um relacionamento com um rapaz parecido contigo... Mas não deu certo... O Aírton entrou entre nós dois...

- Bem que eu percebi que existia uma antipatia entre vocês.

- Confesso que naquele dia eu fiquei com medo de que acontecesse a mesma coisa com você.

- Que bobagem! Eu nem conheço o cara direito.

- Não sei, não... -
Talvez não tivesse percebido nada, mas parecia intuir algo...

- Por falar em casa de Plínio, a gente bem que podia voltar lá. Eu gostei tanto do seu amigo e da casa dele também. - Sentia-me mal com aquela situação. Sempre procurei ser sincero em minhas relações, mas uma força maior que meus princípios fazia com que mentisse e usasse Jonas para reencontrar Aírton.

- É mesmo? Que bom! Plínio é meu melhor amigo e eu gostaria muito que vocês também fossem amigos. - A declaração mentirosa que eu havia simpatizado com Plínio, desviou a atenção de Jonas com relação a Aírton.

- Vamos lá?

- Vamos! Claro!

Fomos para a casa de Plínio, mas antes praticamente obriguei Jonas a passar em um bar para que eu pudesse beber. Ele não gostou muito, pois não bebia uma gota de álcool.

Ao chegarmos, procurei ser o mais gentil possível com o dono da casa, que me apresentou seu caso.

- Deca, esse é Jeremias o novo caso de Jonas. - Sentia-me como se eu fosse o brinquedo novo de Jonas.

- Prazer, Jeremias. - Deca era um rapaz tímido e mantinha um ar triste. Tive muito pouco contato com ele, naquele dia. Ficou o tempo todo lendo.

Percebi que Aírton estava em seu quarto, pois a luz estava acesa. Esperei que a conversa entre Jonas e Plínio tomasse o rumo da matemática. Esqueciam de mim quando falavam em aulas, métodos e livros. Imediatamente dei um jeito de passar pela porta do quarto de Aírton, que estava semi-aberta.

- Oi! Em casa em pleno sábado? - Perguntei ao empurrar a porta e avistá-lo sentado em sua cama costurando uma calça.

- Oi, Jeremias, entra aí!

- Não vou atrapalhar?

- De jeito nenhum! Assim você me faz companhia... Fala a verdade, você deve tá enjoado do papo de matemática, não é?

- Confesso que é um saco.

- Aqueles dois quando se juntam só falam nisso. Foram feitos um pro outro. Não sei por que não são caso.

- Parece que você não simpatiza com eles.

- Não tenho afinidades. Só isso.

- Do que você gosta?
- Ele parou de costurar e me olhou como se enxergasse minha alma.

- Gosto de música, de dançar, de namorar, de ler, de ir à praia, de cinema... que mais... De viver! De preferência, bem acompanhado. - Ele gostava das mesmas coisas que eu e tinha algo que eu não possuía, paixão pela vida. Emanava uma energia que me revigorava. Pela primeira vez, sentia-me apaixonado.

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