domingo, 2 de setembro de 2007

4º Capítulo - Parte II

Aos vinte anos continuava desempregado.

Para me ver livre das observações e cobranças do meu pai, quando não estava dando aula, saía para procurar emprego. Se não houvesse firma a ser visitada, ficava andando pela rua, sem destino, até a noite chegar. Não agüentava mais aquela situação...

No meio de tudo isso o Carnaval chegou.

Apesar do meu jeito introvertido, adoro o carnaval. Talvez porque ele represente a liberdade das emoções. Nele, muitos abandonam suas personalidades cotidianas para viver uma personagem. Era essa magia que me atraía, já que estava preso em uma vida que não sentia como minha. Era uma forma de me libertar de todas as angústias do dia-a-dia.

Mas existia um obstáculo a ser vencido: a timidez. Como faria para me soltar, se a única coisa que tinha feito a vida inteira era me reprimir. Mas uma vez a frustração...

Passei o sábado de carnaval em casa vendo todo o movimento pela televisão do meu quarto. Sentia vontade de sair pelas ruas, mas não tinha coragem. A timidez me dominava completamente, como uma doença que te paralisa. Sempre tive a impressão que a timidez aliada ao homossexualismo foi uma fórmula infalível para estragar minha vida.

Na terça-feira não agüentava mais ficar dentro de casa, mas, também, não conseguia sair. Lembrei-me do dia que saí com Sr. Donato. Havia bebido um pouco daquela cachaça vermelha e aquilo tinha me relaxado bastante. Quem sabe o mesmo não poderia acontecer agora? Fui até a estante da minha casa e dei um jeito de tirar uma garrafa de batida de pêssego que estava ali há muitos meses. Sem que meus pais percebessem, levei para meu quarto e comecei a beber. Os primeiros dois copos desceram bem, o gosto era bem mais agradável que aquela bebida que Sr. Donato tinha me oferecido. No terceiro copo comecei a ficar meio enjoado e ao mesmo tempo um bem estar inexplicável começou a substituir a angústia que me consumia. Uma hora depois não sentia medo de nada, nem nada me preocupava. Vesti uma bermuda e uma camiseta e coloquei algum dinheiro na carteira.

- Pai, mãe, vou sair pra dar uma volta. - Eles me olharam espantados. Só saía de casa para procurar emprego.

- Tudo bem! Cuidado com a rua no carnaval, hein! - Disse minha mãe.

Saí pelas ruas e tudo me parecia lindo. Sentia-me forte e feliz.

Tinha ouvido falar que o carnaval de Madureira era bom. Peguei um ônibus e fui para lá. Assim que cheguei fiquei encantado com a multidão de foliões que cantava e dançava. Quando percebi estava no meio daquela gente sambando como nunca me imaginei (e sambava bem, acreditem). Minha alma feminina, pela primeira vez estava solta. Não lembro de quanto tempo fiquei percorrendo as ruas sambando, cantando e pulando. De repente, notei que a quadra da Império Serrano estava aberta. Fiquei muito curioso. Entrei e fiquei surpreso com a bateria. Sambei durante muito tempo, até que em um determinado momento senti sede. Fui até o bar da quadra comprar uma bebida, nessa altura só aceitaria alguma que tivesse álcool. Comprei uma cerveja.

Percebi que dois rapazes me olhavam. Sob os efeitos do álcool a timidez havia desaparecido. Sorri para eles. Retribuíram meu gesto e se aproximaram.

- Tá sozinho? - Um deles perguntou.

- Tô. Qual o nome de vocês?

- O meu é Márcio. Ele é meu primo Zeca.

- O meu é Jeremias.

- Não quer curtir uma coisa melhor que a bateria.

- O que por exemplo?

- Quer ir lá pro meu apartamento? Quem sabe a gente não descobre?
- Os dois riram, eu também.

- Por que não? Você mora longe? - Zeca manteve-se calado.

- Não. Do outro lado. - Respondeu, Márcio.

- E o seu amigo vai ficar aqui sozinho.

- Não, ele vai junto.
- Mesmo bêbado tive medo. Poderia ser uma armadilha. Mas minha razão estava muito fraca para decidir qualquer coisa.

- Vamos.

Era um prédio simples e bonito. Percebi que os dois estavam meio tensos. Deveriam ter a minha idade ou, talvez, menos. Entramos no apartamento e Zeca me agarrou por trás. Virei-me e ele me beijou. A sensação foi maravilhosa. Aos vinte anos, era o meu primeiro beijo. Ao mesmo tempo Márcio tirou a roupa. Zeca afastou-se e Márcio aproximou-se e me beijou. Seu beijo tinha mais sentimento. Fiquei encantado com Márcio, seu jeito era mais contido, mais profundo. Zeca era do tipo que não se envolvia.

Fui para o quarto e transei com Zeca. Foi rápido e sem graça. Na verdade não tinha me interessando por ele, apesar de ser mais bonito que seu primo.

Márcio entrou no quarto e começou alisar minha cintura. seu toque era diferente, me excitava. Transamos... Foi maravilhoso... Mas de tudo o que mais me marcou foi o beijo. Valeu a pena esperar tanto por aquele momento mágico...

Foram relações, apenas sexuais. Depois de satisfeitos os desejos, nos despedimos e fui embora sem marcarmos novo encontro, mas Márcio me passou o tel dele. Não houve conversa entre nós. Mas não me importei com isso. Naquela noite eu havia vencido várias barreiras internas e externas e, também, havia vivido o meu primeiro beijo... Nem me incomodei com a superficialidade do relacionamento. Talvez, como eu, eles também precisassem daquelas "pequenas grandes" descobertas.


Eu não sabia, mas junto com esses bons momentos e descobertas, começava o meu problema com o álcool...

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